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Autuações no trânsito de mercadorias e a responsabilidade da transportadora

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Fato recorrente no nosso Estado são as autuações realizadas pelo Departamento da Receita Pública da Secretaria da Fazenda do Estado no trânsito de mercadorias, quando não há documento fiscal, ou quando este é considerado inidôneo para a operação realizada.

Fato recorrente no nosso Estado são as autuações realizadas pelo Departamento da Receita Pública da Secretaria da Fazenda do Estado no trânsito de mercadorias, quando não há documento fiscal, ou quando este é considerado inidôneo para a operação realizada. Via de regra, há o documento, mas algum equívoco nele constante faz com que o Fisco o desconsidere, realizando o lançamento do tributo como se não tivesse sido emitido documento algum e, às vezes, presumindo operação diversa daquela efetivamente realizada.
 
Em quaisquer dos casos, o entendimento da Fazenda do Estado vai no sentido de que é possível autuar-se tanto o emitente do documento, quanto o transportador da mercadoria. Baseiam esse entendimento no artigo 7.°, III, “b”, da Lei 8.820/89, que diz o seguinte:

“Art. 7.º – São responsáveis pelo pagamento do imposto devido e acréscimos legais:

III – o transportador, em relação à mercadoria que:

b) transportar desacompanhada de documento fiscal idôneo;”

Lei 8.820/89

Entretanto, a leitura mais atenta à legislação faz-nos concluir que não basta que a mercadoria seja transportada com documento inidôneo para que seja possível a responsabilização do transportador de forma objetiva. Isso porque o artigo 5.°, da Lei Complementar 87/96 diz que: “Art. 5.º – Lei poderá atribuir a terceiros a responsabilidade pelo pagamento do imposto e acréscimos devidos pelo contribuinte ou responsável, quando os atos ou omissões daqueles concorrerem para o não recolhimento do tributo.”
 
A partir disso, é importante dizer que cabe à Lei Complementar, no dizer do artigo 146 da Constituição Federal, estipular as normas gerais de direito tributário quanto aos impostos previstos na Constituição, inclusive quanto aos contribuintes. Logo, as leis dos Estados que instituam o ICMS devem, necessariamente, seguir os ditames da LC 87/96, não podendo prever obrigações mais gravosas do que as dispostas na referida lei complementar.
 
Dizendo a lei complementar que a lei somente poderá atribuir a terceiros a responsabilidade do tributo quando seus atos ou omissões concorrerem para o não recolhimento do tributo, ela diz que para haver a possibilidade dessa responsabilização, deve o Fisco provar que houve a participação deste terceiro no ato de infração à legislação tributária. É o nítido caso de responsabilidade subjetiva.
 
Logo, nos casos em que se transporta com um documento fiscal que contenha equívocos, para se autuar o transportador, deve o Fisco provar que este transportador teve, de algum modo, participação no preenchimento do documento, o que, via de regra, não acontece. Muitas vezes, imputa-se a sujeição passiva da autuação ao transportador sem qualquer menção à sua participação na emissão dos documentos, quanto à qualidade e quantidade das mercadorias etc.. Essa falta de fundamentação desta participação, bem como a falta de prova, torna nulo o auto de lançamento.
 
Esta é, pois, a posição do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. TIT. No caso de transporte de mercadorias, havendo irregularidade nos documentos fiscais relativos à operação, o lançamento deve ser procedido contra a empresa emitente, e não contra o transportador, haja vista que a Lei Complementar nº 87/96 exige, para ensejar a responsabilidade do transportador das mercadorias, a concorrência, o vínculo, o liame, o nexo com o fato em termos participativos para o não-recolhimento do ICMS. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70033166380, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 02/12/2009)

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE DESCONSTITUIÇÃO DE DÉBITO. ICMS. TRÂNSITO DE MERCADORIAS. RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR. IMPOSSIBILIDADE. PESSOA DIVERSA DO EMITENTE DAS NOTAS OU DO REMETENTE DAS MERCADORIAS. O transportador não pode ser responsabilizado pelo tributo devido pelo emitente da nota fiscal, sobre as mercadorias transportadas, a menos que não porte documento fiscal que acoberte o trânsito. Para além disso, a responsabilidade pela emissão, diz-se mais, pela correta emissão do documento fiscal é sempre do remetente da mercadoria, e não do transportador. Apelo desprovido. Unânime. (Apelação Cível Nº 70032410912, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genaro José Baroni Borges, Julgado em 21/10/2009)

Vigésima Primeira Câmara Cível

Logo, as empresas transportadoras que foram autuadas no trânsito pelo Fisco Estadual devem analisar se há no auto de lançamento este liame entre a atuação da empresa e o efetivo ato infracional à legislação tributária. Não havendo, deve buscar a anulação do auto de lançamento.
 
Por Samuel Hickmann

02/06/2010

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